sábado, 17 de dezembro de 2011

Três anos após ser sancionada a lei que instituiu o piso nacional dos professores, os municípios ainda encontram dificuldades para cumprir com o salário de R$ 1.187 para uma jornada de 40 horas semanais

ANGELA CHAGAS

Três anos após ser sancionada a lei que instituiu o piso nacional dos professores, os municípios brasileiros ainda encontram dificuldades para cumprir com o salário de R$ 1.187 para uma jornada de 40 horas semanais.

Levantamento feito com exclusividade pelo Terra em todas as capitais brasileiras aponta que duas não cumprem com a legislação: Macapá (AP) e Porto Velho (RO). No entanto, segundo a Confederação Nacional dos Municípios, a situação é bem pior se levado em conta todas as prefeituras brasileiras.
"Muitos municípios e até Estados não têm como cumprir com a lei da maneira como ela foi proposta, isso quebra qualquer prefeitura. O MEC (Ministério da Educação) faz apenas demagogia com os professores e põe toda a culpa dos problemas da educação nos municípios", diz o presidente da CNM Paulo Ziulkoski.

De acordo com ele, as capitais estão em situação mais confortável porque o repasse dos recursos é maior, mas no geral a situação é crítica. Levantamento feito pela CNM em 1.851 municípios brasileiros, aponta que pelo menos 622 pagam valores inferiores ao estabelecido pela lei.
Para o presidente da CNM, além de um valor elevado, o maior problema para os municípios é que a lei define que um terço da carga horária de professores seja destinada para a realização de atividades extraclasse, como planejamento pedagógico.

"A lei fere a autonomia dos municípios ao definir que um terço do período é para ficar fora da sala. Para cumprir isso, 290 mil professores precisam ser contratados pelas prefeituras. Quem vai pagar a conta?", questiona Ziulkoski.
De acordo com o MEC, Estados e municípios podem pedir uma verba complementar para estender o piso nacional a todos os professores. Para conseguir o dinheiro, é preciso comprovar que aplica 25% da arrecadação em educação, como prevê a Constituição Federal, e que o pagamento do piso desequilibra as contas públicas.

Embora a portaria que aprova a complementação dos recursos tenha sido publicada em março, até o começo de dezembro nenhum Estado ou município havia cumprido com todos os requisitos para receber o dinheiro.
Segundo o presidente da CNM, o ministério estipulou diversas exigências que tornaram "impossível" garantir a verba. "Eles cobram até que se tenha uma contabilidade própria apenas para os recursos da educação. Eles dizem que é para ter transparência, mas é só demagogia para culpar as prefeituras", afirma.
Já o MEC, por meio de sua assessoria, informou que os municípios não conseguem cumprir com as exigência porque "não há foco na educação". De acordo com o ministério, os recursos estão disponíveis para auxiliar todas as prefeituras que "realmente precisam da complementação da verba".
Por que é difícil pagar o piso?
Ziulkoski aponta três fatores como determinantes para dificultar o cumprimento da lei pelos municípios:

O próprio valor do piso, que incide sobre o vencimento básico (assim todas as vantagens, como tempo de carreira, devem ser pagas a partir do mínimo), a correção do valor com base no custo do aluno pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb) e não pela inflação (com base no fundo, o reajuste para o ano que vem deve ficar em torno de 23%, o que seria insustentável pelos municípios já que a receita não cresceu nesta proporção), e ainda a necessidade de cumprir com um terço da carga horária fora da sala de aula.
"Não somos contra reajustar o salário dos professores. Eu acho que bons salários é um dos pilares para a qualidade da educação. Mas da forma como a lei foi feita e ratificada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) o que acontece é mais prejuízo para a educação, pois os municípios precisam gastar todo o seu orçamento com o salário e deixar de investir na manutenção das escolas, na construção de novas unidades, na melhoria da estrutura", aponta.

De acordo com ele, este ano mais de 800 municípios brasileiros gastaram 100% dos recursos do Fundeb apenas com o pagamento da folha dos docentes.
CNTE critica municípios: educação deve ser prioridade 
O diretor de Assuntos Educacionais da Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação (CNTE), Heleno Araújo, critica a posição dos municípios.

"A confederação (CNM) deveria orientar os prefeitos a cumprir com a lei. Se o município não tiver condições, que peça recursos da União para complementar. Mas para isso precisa mostrar sua prestação de contas, quanto investe em educação. O problema é que os prefeitos não são orientados a ser transparentes, por isso não conseguem os recursos", diz.
Segundo Araújo, a educação precisa ser definida como uma prioridade dos governantes.

"Temos aqui uma grande contradição porque prefeitos e governadores, que na época das eleições dizem que o ensino é prioridade, esquecem-se disso ao assumir o cargo", afirma ao citar o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro (PT), que assinou a lei quando era ministro do governo Lula, em 2008, mas como governador do Estado ainda não cumpre com o pagamento do piso.

"Esse é um grande equívoco do governador. Os nossos sindicatos filiados estão orientados a cobrar no STF o pagamento imediato", completa.
Para o presidente da Confederação dos Municípios, essa "mudança de discurso" mostra que muitos políticos não conhecem a realidade dos Estados e municípios. "Escrever uma lei é muito fácil, o complicado é cumpri-la. Quero ver se o Haddad (ministro da Educação), se for eleito prefeito de São Paulo, vai seguir com o mesmo discurso", completa.
De acordo com a Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul, o governador Tarso Genro assumiu o compromisso de pagar o piso a todos os professores até 2014. Um cronograma de reajuste gradual deve ser apresentado à categoria.

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