segunda-feira, 9 de maio de 2011

'Fantástico' flagra má qualidade de merendas escolares em 11 estados; JP também é citada


A reportagem do "Fantástico", mostrou na noite de ontem, domingo (8), que a merenda escolar em João Pessoa é tratada com descaso. A comida é desperdiçada e os cardápios escolares não atendem às necessidades de calorias e de alguns nutrientes. Confira a matéria com vídeo na íntegra:

Merenda escolar na rede pública do país é alvo de investigação


A que ponto chega o descaso. Nem as crianças escapam. O “Fantástico” encontrou na merenda escolar: comida estragada, vencida e armazenada sem a mínima condição de higiene. São casos estarrecedores. Nessa viagem pelo Brasil, a equipe de reportagem flagrou até alunos liberados mais cedo por falta de merenda. Para muitos, esta é a principal refeição do dia.
Uma panela cheia de merenda vai para o lixo. A comida daria para alimentar, pelo menos, 100 alunos de escolas municipais de João Pessoa. Na semana em que a equipe de reportagem da TV Globo passou na capital da Paraíba, flagramos o desperdício de comida. E mais: carnes transportadas de forma inadequada. Ano passado, o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) apontou que os cardápios das escolas de João Pessoa não atendiam às necessidades de calorias e de alguns nutrientes.
No estado vizinho, Rio Grande do Norte, o problema é outro. Depois de duas horas de aula, os alunos foram liberados da aula. O motivo: a falta de merenda. Constatamos em escolas de Natal os poucos produtos que ainda têm no estoque não podem ser utilizados. São nove pacotes – tudo vencido.


“Nos sentimos obrigados a diminuir o horário pelo fato de muitos passarem mal, com dor no estômago e até mesmo desmaiar”, afirma a coordenadora pedagógica Elaine Medeiros.
O “Fantástico” mostrou no último domingo (8) a situação da merenda em escolas de cinco estados. Em Novo Gama (GO), cidade a 40 quilômetros de Brasília, encontramos três gatos na cozinha de uma escola estadual. “Eu lancho só de vez em quando. Um dia desses nós achamos uma barata dentro do lanche”, conta um aluno.
Em uma escola municipal de Novo Gama, a denúncia é de um falso cardápio. No papel, tudo bonito: tem salada, seleta de legumes, filé de peixe ao forno e lasanha. Mas olha o que dizem os funcionários: “No cardápio, é chique demais, mas na prática, não vem. Fantasioso. É só para ganhar a verba, mas não chega”, aponta uma merendeira.
A equipe de reportagem visitou mais de 50 colégios. Em uma escola municipal de Vera Cruz, na Bahia, encontramos um dos piores cenários. A validade do arroz está ok. O problema é a forma como é armazenado. Como não está em um local adequado, tudo vai se estragando.
Achamos comida vencida e mofada. Tem bicho no macarrão. A merenda é feita num local bem apertado, onde fica o estoque e bem ao lado o banheiro. Em Itaparica, também na Bahia, fomos a duas escolas municipais. “Quase não tem merenda aqui. Farinha não. É só açúcar mesmo”, diz uma merendeira. Desde o início do ano, a geladeira da escola está assim: vazia. Só tem água gelada.
O Bom Dia Brasil esteve em outra cidade baiana: Itatim. Em novembro passado, a prefeita da cidade foi presa pela Polícia Federal. Raimunda da Silva Santos foi denunciada por favorecer uma empresa que fornecia merenda. Segundo as investigações, os produtos eram superfaturados e alguns nem chegavam às escolas. Cinco meses depois do escândalo, as crianças ainda reclamam da comida.
“Tem muitas vezes que a gente tira até fio de cabelo de dentro. A gente mesmo, essa semana, pegou um pão que estava mofado”, relatou um aluno.
Em Santa Teresinha (BA), onde o prefeito também foi preso ano passado, encontramos o depósito de uma escola municipal cheio de formigas, o encanamento do esgoto aberto na cozinha e produtos sem data de validade e de fabricação. O charque não tem data de validade, nem quando foi embalado, nem quando foi produzido.
Em Nazaré (BA), um relato revela o completo descaso com as crianças. Uma funcionária diz que os alunos da escola municipal comem biscoito de má qualidade por pressão do fornecedor dos alimentos.
“Eu falei que não ia receber. Então, não ia ter merenda. Tipo assim: eu fui pressionada. Quem pressionou? O fornecedor que venceu a licitação. Vou ficar com a mercadoria parada? O biscoito não tem um sabor agradável”, conta a funcionária.
Em várias cidades do Brasil existem investigações pra apurar irregularidades na merenda. O “Fantástico” mostrou com exclusividade dois depoimentos que, segundo o Ministério Público, ajudam a entender o caminho da corrupção.
Genivaldo Santos foi sócio da Verdurama, empresa paulista do ramo de refeições prontas. Na chamada merenda terceirizada, o município contrata uma empresa e paga para que ela fique responsável pelas refeições. Genivaldo Santos foi interrogado em março deste ano por um promotor de São Paulo. Ele pode ser beneficiado com uma possível redução da pena.
“Eu tinha a finalidade de pagar algumas propinas de alguns municípios, uma média de 10% por ano de propina. São R$ 70 milhões por ano de propina”, calcula Genivaldo Santos.
Agora quem fala é uma testemunha-chave na investigação contra a prefeitura de Taubaté, no interior paulista. Um homem acusa o atual prefeito Roberto Peixoto e a primeira-dama de receber propina de outra empresa de merenda, a Sistal. Ele diz que foi buscar dinheiro da corrupção para o casal 72 vezes.
“Eu servia de mulas para eles. Calculo que o Roberto Peixoto e Luciana Peixoto receberam de propina uns R$ 5 milhões que já foram gastos”, afirma o homem.
“Mais de 50 prefeituras estão sendo investigadas nesse momento em todo o país. São mais de 50 promotores trabalhando na área criminal e na área civil. E na grande maioria dessas cidades há pagamento de propina a prefeitos ou a secretários municipais”, aponta o promotor de Justiça Silvio Marques.
A Secretaria de Educação de Goiás diz que vai tomar providências, inclusive na escola mostrada em que tinha gatos na cozinha. A Secretaria de Educação de Novo Gama negou que o cardápio seja fantasioso, como disseram os próprios funcionários.
A prefeitura de Taubaté classificou como descabida a acusação de que o prefeito recebeu propina. Sobre as empresas envolvidas nas denúncias, a Verdurama diz desconhecer o pagamento de propina. A Sistal afirma que jamais pagou propina a Roberto Peixoto.
Nutricionista de Nazaré (BA) pede demissão
Na cidade de Vera Cruz, a prefeitura disse que as imagens mostradas na reportagem não representam a realidade do município e que isso não se repete em outras escolas. Afirmou também que isso não vai voltar a acontecer.
Representantes da cidade de Itatim e Itaparica não se manifestaram. Em Santa Teresinha, cidade que fica a 200 quilômetros de Salvador, a nutricionista da prefeitura reconhece que os alimentos não suprem as necessidades nutricionais, e mesmo insuficiente, a merenda escolar é de boa qualidade.
Em Nazaré, a prefeitura, assim que soube da reportagem, cancelou o contrato com os fornecedores e a nutricionista da prefeitura da cidade pediu demissão.
PB: 'responsabilidade de fiscalizar é do diretor', diz nota
Em João Pessoa, a Secretaria de Educação de João Pessoa disse que a maioria dos alunos aceita bem os alimentos servidos. Além disso, afirmou que é de responsabilidade de cada diretor de escola fiscalizar a qualidade do produto.
Em nota, a empresa SP Alimentação, que terceiriza a merenda, afirmou que o alimento atende a todos os requisitos legais e que 90% dos diretores de escolas da capital paraibana aprovam a merenda da empresa. O contrato de prestação de serviços venceu em janeiro, mas foi renovado por seis meses, contrariando a orientação do Ministério Público que não aprova a terceirização.
Em alguns casos, o Tribunal de Contas do estado encontrou irregularidades. A assessoria da Prefeitura de João Pessoa não afirmou se pretende continuar ou renovar o contrato da empresa.
globo.com 

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